sábado, 28 de junho de 2008

Desenredo

Repousou a alegria no dia
E a vida toda se resumia
Ao passado ali velado
Diante de todos

Nunca tão solitário
Como naquela hora
Como no outro dia
Para sempre seria
Um pacto quebrado
Desacordo de idéias
Choque, natureza
Fato consumado

Não era a hora
Nem nunca seria
- Cedo demais!
Tão sem razão...

Restou o abandono
Restaram apenas restos
Um caminho reto
A espera de sua vez

À espera do reencontro.
De agora em diante, só.

sexta-feira, 27 de junho de 2008

PF de difícil digestão

Como voltei a trocar o H2O por P3, não vai ter jeito: volta e meia estarei aqui comentando sobre política e politicagem. Juro que queria falar de outros assuntos, mas acontece que estou fula da vida com a Polícia Federal, só penso na PF, só esculhambo a PF, só leio sobre a PF. Uma semana inteirinha nisso: PF e Operação Pasárgada.
Pra começo de conversa, já não gosto dos nomes estrambólicos que os nossos homens de preto inventam para designar os trabalhos que são pagos para fazer. Tenho a impressão de que eles se reúnem pelo menos dez vezes antes de começar a pôr a mão na massa, tudo somente para decidir qual o nome vai soar mais bonitinho na boca do "Bonner, William Bonner" - vulgo Bonner Simpson. Todos filhos do César Maia, herdeiros das invencionices.
Têm a cara de pau de pegar o belo paraíso machista de Manuel Bandeira para designar um trabalho que consiste em desarticular uma quadrilha que libera recursos do FPM para os municípios com dívida no INSS. Beleza.
Mas aí, eis que Tarso fica de birra com Dilma e o PT de São Paulo acha que tem que dar uma lição no PT de Minas, que por sua vez acha que dá para tatuar uma estrela num tucano. Resultado desse samba de crioulo doido? Mais de 300 prefeituras mineiras e o Tribunal de Contas do Estado viram noticiário no horário nobre como participantes de uma gangue (ou, como define a lei penal, são acusados de "formação de quadrilha").
Pra resumir a mistureba: a PF disse que uma empresa faz a falcatrua. Só que a dita empresa é excelência em sistema de informação, e por isso presta serviços a centenas de municípios em todo o país. Aí, os cerca de 300 prefeitos mais os 300 secretários municipais de Finanças de Minas que têm contrato com a tal empresa, viram imediatamente cúmplices da empresa. Entendeu? Tipo assim: você faz compras regularmente num supermercado e a polícia depois descobre que o tal supermercado (qualquer semelhança com fatos reais é mera coincidência...) compra carga roubada. Aí prende o dono do supermercado e os consumidores - estes, por crime de receptação de produto roubado. Faz sentido para você? Pra PF faz.
Enfim, não quero defender ninguém mas também sou cismada em condenar assim tão facilmente. O que eu vejo é uma leviandade filha da puta às vésperas de uma eleição. O que eu vejo é centenas de prefeitos (de todos os partidos) sendo esculhambados independente de merecerem ou não. O que vejo é essa maldita tendência de simplificar esculhambando, dizendo que político é tudo farinha do mesmo saco. Eu, pelo menos, já tive o prazer de conhecer político decente. Da mesma forma que tive o desprazer de conhecer religioso profissional pedófilo e ladrão, ONGs que sobrevivem de dinheiro governamental, cirurgiões que aconselham uma cirurgia antes de um tratamento alternativo, jornalistas que escrevem reportagens em troca de convites para festa, etc.
Bom, desabafei. Posso até não ter sido suficientemente clara, mas é que nem tudo pode ser dito. Particularmente, fico aqui torcendo para que um balão junino acerte bem a cabeça de Tarso, que o PT de SP continue a perder eleições, que o PT de Minas descubra o significado de ideologia e que os responsáveis pela Operação Pasárgada caiam nas garras de Joana, a louca da Espanha (rainha e falsa demente...).

segunda-feira, 23 de junho de 2008

Corrosão

Corro contra um tempo
Do qual já não mais disponho
E perco-o propositalmente
Muito mais que o encontro
E - tarefa das mais difíceis -
Tento torná-lo útil:
Maximizo sua precariedade
Ou minha incapacidade de aproveitá-lo
Desperdiçando-o parada pensando no proveito
Ou correndo desatenta,
Querendo agir mais que os ponteiros
Viciada nos prazos quase sempre prorrogáveis
Deixando a vida cada vez mais sem tempo
E o tempo cada vez mais sem vida
Embora faminto, sempre.

segunda-feira, 16 de junho de 2008

Mamãe quer que eu case!

Quinta-feira, 12 de junho.
- Cláudia, sabe que dia é hoje?
- 12 de junho, dia dos namorados.
- Não. Quer dizer, é. Mas é outro dia também. É véspera de Santo Antonio.
- Sei.
- Não vai fazer as simpatias não?
- Que mané simpatia?
- Pra ver se você vai casar.
- Hum... Quero não. Chega desse negócio de casar, não nasci pra isso não.
- Mas minha filha...
- Mãe, vá perdendo as esperanças. Sua filhinha querida não vai casar de novo, nem vai lhe dar netos. Agora a senhora tem que concentrar suas forças nos seus dois filhos homens, porque eu liguei as trompas.
- Ligou? Como assim, que história é essa?
- Modo de falar, mãe. Só estou querendo convencer a senhora a desistir de torcer por essa vidinha tradicional. Aceite o fato: sua filha tem alguns parafusos a menos.
- Isso eu já sabia. Mas não custa nada.
- Não custa nada o quê?
- Não custa nada fazer as simpatias. É como uma brincadeira, Cláudia. Não custa nada mesmo.
- Perda de tempo. Não acredito nisso.
- Que perda de tempo? E quem disse que precisa acreditar? Faz por fazer, oras.
- Se é por fazer, sem significado algum, então é pura perda de tempo mesmo.
- Mas faz, vai.
- Ih, mãe...
- Eu tô pedindo!
- Mãe, que mico...
- Não custa nada...
- Que é que a senhora quer que eu faça?
- A simpatia da bananeira. Tem bananeira no pomar, não custa nada.
- Tá, e o que é que eu tenho que fazer?
- Enfiar uma faca virgem na bananeira. Aí amanhã, quando você tirar a faca, tem o nome da pessoa com quem você vai se casar?
- Mas e se eu não for casar?
- Aí não aparece nada.
- Mãe, não vai aparecer nada, então.
- Mas faz. Não custa e...
- Tá, tá. Mas não posso fazer. Não tenho faca virgem aqui.
- Eu tenho, comprei nessa semana.
- Mãe! A senhora planejou tudo!
- Não, filha. Foi coincidência. Eu comprei uma faca nova porque as daqui não estavam afiadas.
- Sei. Então me dá a faca, vamos terminar essa tortura.
(Era para tentar assassinar a bananeira à meia-noite do dia 12. Fiz isso duas horas antes do determinado, porque meu sono é ainda mais incrédulo do que eu).
No outro dia...
- E aí, o que é que deu? Cadê a faca?
- Ah sim, a faca. Pera, vou buscar. Tá aqui, toma.
- Deixa eu ver, deixa eu ver.
- Mãe, não saiu porra nenhuma. A faca tá toda manchada mas é do sumo da planta. Deixa de crendice, deixa de besteira.
- Tá aqui, tá aqui! Ó! Que letra é essa? Um P? Não... é um V. Ah não, tem uma outra perninha aqui, acho que é um W. E isso que tá escrito depois? Cláudia, tem um nome todo escrito! Começa com W e termina com DO. Wando!
- Ah, mãe, é só o que me faltava: vou casar com Wando, o cantor das calcinhas, o autor das trilhas sonoras de motel barato. Já tô até vendo o cara vir me dar uma cantada: "Eu quero me enrolar nos seus cabelos..."
- Não disse que ia ser o cantor. Vai ser um homem chamado Wando. Deixe de esculhambar com essas coisas que a gente não explica.
- Mãe, a única coisa que eu não explico aqui é como a senhora me convenceu a enfiar uma faca na bananeira. O resto é lógico.
- Você não acredita, mas tá aqui escrito. Começa com W e termina com DO. Eu fiz essa simpatia e deu certo, apareceu um A.
- Pô, mas A é mais fácil de dar certo. Tem um monte de nome com A. Queria ver se tivesse saído um W terminando em DO, se a senhora ia dar crédito ao santo.
- Não vou discutir com você. Você não respeita a fé. Daqui a um ano a gente discute novamente. Aposto que você vai estar casada.
- E eu aposto que no próximo ano a senhora não me convence de novo a fazer essa palhaçada.
- Wando. Quando conhecer alguém com esse nome, fique atenta. Vai ser seu marido.
- Sossegada. Se um dia eu conhecer algum Wando, uso essa mesma faca para matá-lo antes que Santo Antonio queira me enfeitiçar só para me desmoralizar. A senhora tem cada uma...

quinta-feira, 12 de junho de 2008

A Final


Silêncio.

O dia amanheceu assim: mudo. Para mim.

Sem buzinas, sem comemorações, sem fogos.

Mudo, surdo, cego, aleijado. Diazinho ruim.

É quando a alegria dos outros nos destrói.

É quando o grito dos outros nos impõe o silêncio.

Pior é saber antes que seria assim,

Fosse qual fosse o resultado. Ruim, sempre.

Não era o meu time que estava lá:

Eram meus inimigos disputando a final.

Absurdo. Absurda. Ruim. Muda.

quarta-feira, 11 de junho de 2008

Pelo bem de sua sanidade

Ele é tricolor também!!!!

Foda-se. Foda-se. Foda-se.
Não há desabafo melhor: foda-se.
Para o bem e para o mal, foda-se.
Que meus amigos se fodam.
Que meus inimigos fodam-se.
Bem faz o paulistano que não liga o pisca, liga o foda-se.
(Sai da frente, estou com o foda-se ligado, não está vendo?)
Foda-se, pentelho chato filho da puta.
Foda-se, despertador.
Levou um fora? Que se foda.
Mau humor? Foda-se.
Mal amado, carente? Foda-se.
Crítica ao meu palavreado? Haha... Foda-se.
Qual o problema se minto? Foda-se.
E daí, se eu não gostei? Foda-se.
Ah, você não gostou? Foda-se.
Não quer mais ler? Foda-se.
Enjoou? Foda-se mais ainda.
E quer saber de uma coisa?
FODA-SE.

__________________
Repita esse mantra dez vezes ao acordar. Assim, você estará pronto para encarar uma campanha eleitoral. A cada raiva que o seu candidato lhe fizer, recite o mantra baixinho, olhos fechados. À raiva que os membros do comitê lhe fizer, responda com o mantra. Quando o causador de sua raiva for o opositor, transforme o mantra em metáfora e divulgue no horário eleitoral gratuito.

segunda-feira, 9 de junho de 2008

Timidez


Quem me conheceu depois de adulta (ou seja, de uns dois anos para cá) estranha quando eu comento sobre minha timidez. De fato, hoje não carrego nenhum traço visível de timidez em âmbito algum de minha vida. Mas até os 18 anos, eu era uma das pessoas mais tímidas que já conheci. O costume de andar olhando exclusivamente para os próprios pés era uma das minhas marcas, que chegou a preocupar um ortopedista: "essa menina terá problemas na coluna se continuar assim", advertiu aos meus pais, quando eu ainda tinha seis aninhos. Por sorte, minha coluna é perfeita.

Era daquele tipo que senta na primeira cadeira da sala de aula, colada à mesa do professor. Na hora do recreio, ia direto para a cantina e depois corria para o bosque, onde sentava num banquinho ou no chão, à sombra, e lia até tocar o sinal de volta à aula. Estudei no São Bento de Olinda. Não sei como, ainda fiz coral e teatro. Quanto a esportes, a partir dos 13 anos concentrei-me no vôlei, mas até então já tinha feito ballet, atletismo, basquete, handebol, natação. Tímida de ficar vermelha ao perceber que alguém estava me olhando. Na maior parte do meu tempo livre, estava lendo, ouvindo música ou jogando tênis de mesa.

Aos 15, mais ou menos, percebi que não dava mais para continuar com aquela timidez toda. Tentei abrir um leque, pequeno que fosse. Comecei a sair, participar de festas, fazer umas farrinhas. Mas a timidez tava ali, marcando presença sempre. Era incapaz de conversar com um estranho. Incapaz de puxar conversa com alguém que eu não conhecesse bastante. Falar sobre mim, então, era um suplício. Mal conseguia olhar nos olhos de algum paquera. Meus namoros da adolescência foram todos uns primores na arte feminina de negar e escorregar.

Aí eu quis sair de casa. Aliás, sentimento que carrego desde que me entendo por gente. Ao contrário de minhas amigas da época, não planejava um futuro com marido e filhos. Queria era ter minha grana, minha casa, e poder viajar muito. De carro, preferencialmente. Até hoje prefiro viajar de carro a qualquer outro meio de transporte. Não ônibus: gosto de dirigir meu carro mesmo.

Bom, mas quando achei que era tempo de sair de casa (18 anos) fui enfrentar um monstro do qual ouvira falar muito, mas nunca tinha visto: mercado de trabalho. Tive que ensacar minha timidez e, inexperiente, andar pelo centro da cidade com os classificados dos jornais embaixo do braço. Toparia qualquer coisa, desde que não fosse venda/comércio - nunca levei o menor jeito para isso.

Alguns meses de andada inútil e então veio a oportunidade: uma empresa de comunicação precisava de um estagiário de jornalismo a partir do último ano do curso. Eu estava matriculada no primeiro semestre... mas fui. Menti (meu rosto deve ter ficado roxo), fiz os testes e passei. Achava que tinha que mentir direito, e para isso eu não podia demonstrar aquela insegurança, aquela timidez. E assim, fazendo de conta que eu era outra pessoa, consegui o meu primeiro estágio (já fazendo campanha política), consegui adestrar - ou esconder - minha timidez, consegui a grana que precisava para pagar meu curso e me manter. Em cima de uma mentira. Enrolei o RH da empresa por oito meses, dizendo sempre que o comprovante de matrícula universitária não saia por causa da burocracia da Unicap... Quando enfim conseguiram me colocar contra a parede (curiosamente, dez dias depois das eleições), eu confessei o crime e fui demitida. Tudo bem, já tinha outros dois estágios em vista, por conta da experiência que havia adquirido...

Bom, depois disso eu só vim a sofrer com a timidez no dia em que dei minha primeira palestra. Era um encontro de jornalistas. Tudo preparado para o meu chefe fazer a apresentação do nosso projeto de comunicação. Na hora H, sabe-se lá por quê, ele mandou que eu fosse. Já estava na hora de apresentar, o projeto já fora anunciado, eu não tive nem tempo de discutir. Só senti um febrão me invadindo, o coração se agigantando no peito, tomando todo o ar disponível no mundo. Ainda quis protestar, mas o olhar do chefe não deu margem para isso. Fui. Estava absolutamente inconsciente durante os dez primeiros minutos, pelo menos. Não faço idéia do que falei, tal o pavor que sentia. Suava em bicas, senti a bexiga super-lotada. Mas deu certo, o projeto foi apresentado e aplaudido.

Passei no teste. Mas depois disso, decidi ser sem-vergonha, sem-timidez. Sofre-se menos assim. Por incrível que pareça, só não consegui superar de verdade mesmo um incômodo: falar ao telefone. Detesto, odeio, morro de vergonha de ligar para alguém. Ligar para celular, então, é um suplício dobrado. Se precisar, eu ligo. Mas não sem antes paquerar bastante o aparelho enquanto me questiono: é preciso mesmo ligar? Talvez mais tarde... Será que não vou atrapalhar?

Um inferno.

sexta-feira, 6 de junho de 2008

Ilusão


Despertei atormentada pela hora
Prevendo e receando um atraso
A perda da oportunidade última
A sorte a olhar para trás, dando adeus...
Corri à tua procura
Quarto, sala, banheiro, nada
Não te encontro, e agora?
Terraço? Nada; Calçada? Nada
Foi-se. Não há tempo, acabou.
Corri como louca pela estrada
Senti-me presa a um motor
Que naquele instante não havia
Uma carona? Uma ajuda? Nada
Resta apenas o lamento.
Você foi embora.
Não me esperou.
Como poderia?
Não sabia de minha intenção
Não sabia de minha necessidade
E eu precisava falar-lhe
Eu precisava pedir um favor
Mas agora é tarde, você se foi.
Dobro o papel em minhas mãos
Guardo-o no bolso, com pesar
A sensação da sorte a escapar-me...
Quem sabe no próximo sorteio?
Quem sabe não acumula?
Uma aposta perdida...
Não é dessa vez que fico rica.
(Inspirado no desespero real de minha mãe, ao acordar tarde e descobrir que tinha perdido a carona para ir à cidade, onde pretendia apostar na megasena)

quinta-feira, 5 de junho de 2008

Absens


Fosse apenas um safado, seria até bom. Não, não dava para estigmatizá-lo com adjetivos simples. Havia sempre um "mas", um "embora" para definí-lo. Era ainda vulgar, só que não de um jeito simples, comum: a sua vulgaridade era única, apresentada em palavras e mascarada em entonação e fim. Tipo da figura que se ama ou se odeia, sem meios termos. Tipo de pessoa a quem não se faz pergunta direta, objetiva, se há algum receio de resposta franca. Capaz de ferir rindo ou aos prantos - e nem sempre as reações eram obviamente previsíveis. Sobretudo, um homem simples e muito inteligente. Um perigo.

Era um bom inimigo. Jamais agia pelas costas, jamais traiu a ninguém, principalmente a si. Odiava profundamente. Era um ódio orgânico, que nascia das entranhas, misturava-se ao sangue, percorria todas as veias, envermelhava o rosto, escapava na forma de suor e febre. Febre de ódio. Não era polido o suficiente para esconder suas emoções nem escolher reações sutis. Não raro, agia com violência. Nem sempre com justiça. Um animal em tudo.

Amava despudoradamente. Amava primeiro, julgava depois, e sempre julgava. Presenteava as pessoas queridas com um olhar infantil e cúmplice mesmo quando discordante: aos amigos, tudo. A mão pesada, esquecida da força, afagava sempre que necessário. Os musculosos braços desmanchavam-se em abraços aconchegantes, paternais. Tinha uma idéia pronta para qualquer ocasião, fosse qual fosse o assunto, especializado ou não; era homem de uma lógica incomum e rapidamente formulada. Silêncio não era com ele. Nem resignação.

Mamífero amante dos prazeres, não se dava ao direito de se negar. Havia abusos, havia exageros, por vezes chocava. Não era feito de celulose, seu manual de conduta nunca fora escrito, ordenar-se era seu direito privativo, só seu. Desgastou-se cedo, optou pela intensidade - ou talvez não lhe tenha surgido uma outra opção razoável.

O certo é que soube "ser", a despeito de tudo, para o bem e para o mal. Indecifrável, intraduzível, singular. Como essa sua ausência que sinto.


segunda-feira, 2 de junho de 2008

Chega do caso Isabella!


Tenho todo respeito pela família (claro, a parte não participante do assassinato) da menina Isabella. Mas há muito tempo não aguento mais a exploração que a mídia faz do assunto. A defesa do casal acusado do crime agora contratou novos peritos para desancarem o trabalho feito pela polícia paulista. E todo dia, novos "fatos" são noticiados com destaque nos telejornais. Já disseram (e desmentiram e voltaram a dizer) tantos absurdos, tantas estórias fantásticas, que, a despeito da seriedade com que se deve encarar qualquer homicídio, minha imaginação resolveu dar algumas idéias para a defesa do casal e para os pobres colegas jornalistas, já cansados de terem que criar uma novidade do caso a cada santo dia.
Aliás, essa brincadeira (tudo bem, entendo os que a acharem de péssimo gosto) me faz lembrar o veterano jornalista Márcio Maia, editor de Polícia durante muitos anos do Diário de Pernambuco. Segundo o próprio, é dele a invenção da famosa "Perna Cabeluda", assunto iniciado no DP por falta de matéria e excesso de imaginação do editor, e logo repercutido por outros órgãos da imprensa e, claro, pelas mais diversas autoridades do Estado, entendidos e investigadores do caso da Perna Cabeluda - que eu não lembro se era um personagem assassino ou tarado ou ambos.
Voltemos ao caso Isabella.
1 - TEORIA COMÉDIA HOLYWOODIANA: a menina trocou de corpo com a madrasta e resolveu se vingar de todo mundo, matando a madrasta (no corpo de Isabella) e ainda culpando o pai. Não calculou que seria também indiciada, por isso hoje jura que se dava bem com a menina (que na verdade, é ela mesma). Confuso? É, coisa de Holywood.
2 - TEORIA DISNEY: A culpa é da madrasta, que colocou feitiço no Big Mac do marido na paradinha que fizeram no shopping. Ele comeu o Big Mac com Fanta Uva (mais uma prova de que não estava de posse plena de suas faculdades mentais) e, horas depois (quando o feitiço fez efeito), ele ficou tão idiota que inventou aquela estória esdrúxula de que um homem entrou no ap, matou a filha, jogou-a da janela e fugiu - não sem antes trancar a porta com chave. Como ele já era muito idiota antes de ingerir o veneno, ninguém sabe se o feitiço ainda está fazendo efeito ou não.
3 - TEORIA O EXORCISTA: Madrasta e pai não têm culpa de nada. Enquanto o abnegado pai ia auxiliar a maternal madrasta a trazer os inocentes filhos ao belo apartamento, Isabella ficou à mercê de um espírito maligno. Tal espírito seguiu a família desde o shopping. A menina não percebeu, mas no cruzamento que fica entre a Lojas Americanas e a Drogaria Última Compra, havia um despacho que a inocente garota pisou, libertando, assim, o espírito de um "avião" da Favela do Alemão, morto há um mês pela Tropa de Elite carioca. O espírito primeiro incorporou na madrasta, que veio maltratando filhos e enteada durante o trajeto para a casa. Depois, se apossou do corpo da menina e, vendo o futuro que lhe destinava (mulher classe média paulistana filha de um advogado e de uma católica que frequenta missa de Marcelo Rossi), se atirou do prédio - não sem antes causar um monte de bagunça e ferimentos, como qualquer espírito ruim faria.
4 - TEORIA DRAMA PSICOLÓGICO INFANTIL. Na verdade, Isabella era maníaca-depressiva e guardava um imenso rancor da madrasta e do pai e da mãe e dos avós maternos e dos avós paternos e da tia e da professora do ano passado e da professora deste ano. Todos lhe tratavam com discriminação, como se fosse uma criancinha. Naquela noite sombria de sábado, ela fora forçada a acompanhar a família a um passeio a um shopping de São Paulo (imaginem a tortura! Tudo lotado!), a comer pizza sem catchup e sem maionese, e a tomar guaraná diet para não engordar. Quando tudo parecia o fim do mundo, eis que vê, na vitrine, uma linda bota lilás da Barbie. Pediu, implorou, chorou para que o pai comprasse. Ele, com a desculpa de que já lhe comprara 426 botas só da Barbie, se recusara a fazer este pequeno favor. E o que se seguiu adiante, e que todos os brasileiros sabem (querendo ou não), foi fruto da vingança elaborada por uma pequena criança maníaca-depressiva que teve negado o seu constitucional direito a ter a 427ª bota da Barbie.
5 - TEORIA ALCÓOLATRA: Enquanto o pai descia para ajudar a esposa a trazer os filhos, Isabella ficou sozinha no apartamento. Pegou uma garrafa de cachaça, abriu e entornou tudo de uma vez, como se fosse coca-cola. Em seguida vomitou (como a perícia provou), caiu (eis o corte na testa) e resolveu ir ao banheiro. Chegando lá (na verdade, chegou ao quarto do irmão), estranhou o box estar completamente fechado. Pegou uma tesoura, cortou a "cortina" e mergulhou com tudo no chuveiro, para um salvador banho gelado. Na verdade, mergulhou para a morte.

Estórias absurdas, desrespeitosas, desumanas? E as inúmeras versões que já ouvimos acerca do assassinato da menina são o quê?