Semana passada estive em Alfenas, cidade do sul de Minas onde morei por um ano e meio. Uma grande amiga está se mudando para lá, e pediu que eu a ajudasse a alugar uma casa legal por lá. A tarefa é desagradável sempre: ir em imobiliária, pegar chaves, deixar documentos, andar a cidade toda abrindo portas, percorrendo cômodos, devolvendo chaves, pegando outras... Mas em Minas isso é muito pior ainda.
É que em Minas o povo gosta de conversar. E conversa, conversa, conta a vida de sua família e dos vizinhos e das famílias tradicionais. Pergunta de tudo, também. Objetividade é um conceito pra lá de subjetivo por essas bandas. É um jeitinho que tanto pode ser cativante quanto cansativo. Agora, imagine isso quando você precisa percorrer toda uma cidade em busca de um imóvel para alugar...
1ª imobiliária visitada. Na entrada, um painel com umas 18 fichas de imóveis para alugar. Olho o quadro e constato que há apenas duas hipóteses interessantes, o resto era inviável, com localização ruim. Um corretor se aproxima.
- Pois não?
- Queremos alugar uma casa na região do centro, de preferência perto da Unifal.
- Hum... tá ruim... tá difícil... A gente tá quase sem casa. Serve apartamento?
- Pode ser. Mas a preferência é por casa. Essas duas aqui, a gente gostaria de ver. É possível.
- Olha, vocês até podem ir, mas eu vou avisando logo: as casas estão ruins. Em péssimas condições. Tem que fazer reforma.
- Não, pra fazer reforma a gente não quer. Temos pressa, a mudança tem que ser rápida.
- Hum... sei... Então é melhor nem ir lá. Não serve apartamento?
- Serve, já que não tem opção mesmo... Quais apartamentos o senhor tem disponível?
- Tem esses dois aqui no centro.
- A localização é ótima. Podemos visitar?
- Claro. Peraí que eu vou buscar as chaves.
Em outra sala, o corretor que nos atendia covnersa com um colega:
- Você viu a chave dos apartamentos do centro?
- Hum... acho que estão na segunda gaveta.
- Não estão. Será que estão na primeira?
- Pode ser, olha aí.
- Não encontrei.
- Vê na terceira.
- Também não.
- No quadro de chaves?
- É pode ser. Vou ver. Não, as chaves não estão aqui.
- Então alguém deve estar visitando.
-É, deve ser.
O corretor volta e fala conosco:
- As chaves não estão aqui. Acho que alguém pegou para visitar. Vocês podem voltar lá para o final da tarde? Talvez, se alguém pegou, já possa ter devolvido nesse horário.
- Sem chance, amigo. Valeu e boa sorte.
Saímos rindo muito, ainda de bom humor. Isso, evidentemente, evaporou depois de visitarmos a segunda, a terceira, a quarta... e as cenas se repetirem, com mais ou menos fidelidade. Na hora do almoço, paramos num restaurante conhecido meu. Lá, perguntei se a dona não conhecia alguém que tivesse imóvel para alugar. Não se passou nem um minuto e ela ressurge na minha frente com um velhinho simpático.
- Boa tarde. Vocês estão procurando casa?
- Sim, sim. O senhor tem alguma para alugar?
- Eu tenho, eu tenho. Tenho três casas, sabe? Tudo no aluguel. Uma fica bem aqui, perto do Itaú, você sabe onde é o Itaú? Bem na rua do Itaú. Quer dizer, não é bem na rua, mas é como se fosse. Você desce o Itaú, anda duas quadras, vira assim, sobe a primeira à direita, aí vai encontrar a padaria de seu João, sabe onde é? Aí depois que passar a padaria você vai ver minha casa, uma branca com muro alto e portão verde. Quer dizer, acho que aquela cor não é verde não, acho que é cinza. Não, não, é verde mesmo. Essa é uma casa muito boa, grande. O quarto de casal - a senhora é casada? - é bem grande, tem um banheiro separado. E tem quintal, um quintal grande, dá até pra criar cachorro. A casa é muito boa. Mas essa já tá alugada. Tem mais duas, uma que fica...
- Mas as outras duas também estão alugadas?
- Estão, estão, tá tudo alugada. Minha mulher também tem duas casas. Uma delas fica no bairro Morada do Sol, a outra já é mais perto do centro, pertinho da Unifal. Mas essa casa não é muito boa não, porque tem muito estudante que passa por lá fazendo barulho a qualquer hora do dia. Sabe como são os estudantes, né? Um dia mesmo, uns passaram por mim gritando, fazendo uma zoada danada, era véspera de um feriado. Qual era o feriado mesmo? Acho que era 7 de Setembro. Caiu numa quinta, o 7 de Setembro?
- Não sei. Mas a casa me interessa. Qual a rua?
- É aquela perto da Unifal... mas não presta pra senhora, não. Os quartos não são grandes, e só tem dois quartos. Além do mais, está alugada.
- Ah, está alugada?
- Sim, está. Minha filha também tem três imóveis. Ela é psicóloga e se formou também em Direito e em Administração de Empresas. Casou com um rapaz daqui, que fez odontologia na federal. Agora eles moram em São Paulo. Ela já tem duas filhinhas, cada uma mais linda que a outra. Compraram uma casona grande em São Paulo, bairro chique, muito bom mesmo. E ela tem ainda três imóveis aqui, que ela aluga. Normalmente ela aluga para estudantes, porque aqui em Alfenas tem a federal e muitos estudantes vêm do Brasil todo pra cá, e aí...
- Mas os imóveis dela estão para alugar?
- Não, estão todos alugados.
- E o senhor conhece alguma pessoa que está com o imóvel para alugar?
- Não, isso tá dífícil. Porque, como eu ia dizendo, aqui tem muito estudante, e aí alugam os imóveis todos e...
Guenta. Isso foi o dia todo. No final, já em desespero, conseguimos miraculosamente encontrar uma pessoa que tinha não um apartamento, mas um prédio inteiro para locação. Enquanto conversávamos com ele a família que estava alugando o último ap disponível do prédio desistiu do contrato. Pegamos na hora, por muita sorte.
É, meu amigo... parodiando o ditado famoso, torresmo é bom mas não é mole.