quarta-feira, 21 de janeiro de 2009

É a estrada!


Cara, amanheci mais velha. Não, ainda não é meu aniversário, ainda tenho alguns dias de idade atual. Ainda assim, estou mais velha. Irreversivelmente. Inacreditavelmente.
Não foi uma ruga no rosto quem anunciou esse triste fim de Policarpo Quaresma. Não foi a preguiça de levantar, hábito que venho adquirindo aos poucos. Não sei que vento trouxe essa certeza: o fato é que, antes mesmo de abrir os olhos nesta manhã, eu SABIA que estava mais velha.
O que sinto? Sei lá, nem tenho percebido tanta mudança assim. Ainda corro no meio da rua, ainda tomo banho de chuva (só quando é chuva grossa), ainda subo em árvores e planto bananeira debaixo d´água. Ainda danço pra caramba, ainda bebo pra caramba, ainda sorrio mil vezes mais que choro. Ainda nem me conscientizei de verdade que eu tenho obrigações na vida! Tanta coisa a descobrir, tanta coisa para mudar, tanta coisa para deixar de fazer antes de envelhecer.... E agora? Tô mais velha, cara, e tenho que me convencer racionalmente disso, ainda por cima!
Fiquei uns 10 minutos parada na cama, olhar vazio para o teto, só assistindo o filme que passava na memória. Deu saudades. Senti a falta de meu pai. Senti inveja de minha infância passada com meus primos - toneladas deles. Rapida e violentamente, passeei por todas as cidades que já tive o prazer de morar. Aí, exatamente nesta parte, encanei: caralho, dizem que quem tá pra morrer assiste a esse filminho particularíssimo. Será que...? Caralho... Pô, mas já????
Levantei em um salto. Tá, tô mesmo ficando mais velha, porém uma coroa inteiraça, do tipo que encosta a cabeça no joelho sem ter que implorar misericórdia aos céus. Herança de meu tempo de bailarina. Ainda dá pra acordar saltando da cama. Olhei para o guarda-roupa e vi que tinha pouquíssima roupa que pudesse me identificar com minha mais recém-descoberta idade. Cara, mas eu também não preciso demonstrar esse peso que passei a sentir tão subitamente, né? Visto um vestidinho vermelho, meio curto. Olho no espelho, olho de novo, de novo e brado, vencida: merda, você tá uma velha ridícula com essas pernas à mostra nesse vestidinho adolescente. Troquei. Escolhi uma calça social preta com blusa preta e sandália de salto alto. É... antes ser chamada de urubu que ser recebida por risinhos de loiras no meio da rua. Foda.
Hora do banho. Aí, eu já entro no banheiro encanada com minha encanação. Porra, que idéia é essa de estar velha? Tenho uma vida social bem ativa, excelentes amigos, bons parceiros, contas em dia, grana sempre disponível para os pequenos e indispensáveis prazeres. Parei de fumar (hum... talvez seja tempo de reverter isso). Enfim... encanei com a encanação.
O banho é sempre um demorado processo. Tão demorado, e frio por opção, que conseguiu me chacoalhar e me fez desencanar de uma vez por todas. Não vesti o uniforme de viúva, dispensei o vestidinho vermelho (deixei pra night), coloquei uma calça jeans descolada e uma blusinha de malha confortável e com um decote interessante. Nos pés, uma sapatilha com saltinho. Nem oito, nem oitenta.
Enquanto me trocava, pensei na besteira que tinha me atacado sem razão alguma. Ri. Ri um bocado. Contei para os amigos, e rimos todos juntos, tomando café da manhã. Tiraram muita onda da minha cara, mas tudo bem, esses são meus amigos. Vamos todos trabalhar. Saio na frente de casa para abrir o portão. Distraída, bati de leve no braço de uma estudante que passava pela calçada. Tinha uns 15 anos, a miserável.
- Desculpa, foi mal. Eu não te vi passando...
- Tudo bem, tia, fica tranquila.
- A puta que te pariu tá boa? A rapariga da tua tia já largou da zona? E você, tá indo tirar o plantão dela, sua filha de uma que rincha? Mal-educada...

Moral da história: velha é foda.

3 comentários:

Anônimo disse...

hahahahaha

Ah! Consegui ser a primeira!!

Vou te contar uma de hoje:passei em frente ao espelho e achei a mulher do lado de lá bem mais caída do que eu... Pode?

Pode, felizmente fazemos (ou eu faço) uma imagem melhorzinha de nós mesmos. A lembrança que tenho de mim não tem 20 anos, claro. Mas é melhor do que eu própria...

Adorei seu texto, ri à beça!

Beijo

Ana Cristina disse...

Eu adoooooooooorei essa história. Véio, já estou com quase quarenta e odeeeeeeeeeeeio ser chamada de tia. Costumo dizer: "só tenho uma irmã e sei que ela não está na zona!" Então não tenho sobrinhos soltos por ai.
Mas, brincaderias à parte, o problema social é grave!!

Canto da Boca disse...

kkkkkkkkkkkkkkk

Que saudades de vir aqui, porque a de te ver é redundante... Mil coisas acontecendo comigo, e vc aí na cama se achando velha, ora, poupe-me! Velha é a estrada...

E sabe que eu me divirto quando as amigas das meninas me chamam de tia e ao redor todos se entreolham? E me olha, e me analisam e me tudo?

Vou enviar por correio meu skype, precisamos converar e nao é uma conversa qq nao, é demorada, do tamanho da saudade que sinto.
Um beijo enorme, tia!