domingo, 21 de setembro de 2008

Bandeira Vermelha

Sou petista. Assumo meus vícios.
Estamos vivendo uma eleição muito diferente. Uma eleição sem partidos, uma eleição em tons pastéis. Somente os perdidos estão se dando ao luxo de falar mal dos opositores. Os possíveis vencedores ficam numa postura chata de "não sei do que estão falando, não é comigo, eu não me rebaixo" - somente na frente da tela, claro. Acabou aquela história de "vote em fulano porque ele é PT", ou de outra legenda qualquer. Os candidatos estão escondendo suas legendas. É propaganda eleitoral para cegos: sem legenda. Quanta diferença...
Não costumo ser saudosista, mas não dá para ser diferente agora, em se tratando de campanha. Dá um desgosto danado ter que fazer essa campanha assim, com cheiro de água, com gosto de água, com jeito de água com açúcar. Campanha-padrão: você formula na puta que pariu e usa a mesma em 857 municípios que dá na mesma, e todo mundo gosta. Sem cara própria, sem garra, sem tesão, sem militância. Eca. Fosse assim, era melhor resumir essa porcaria a um debate semanal temático para todos os candidatos e só.
Onde estou trabalhando, por exemplo. Nenhum candidato assume sua legenda com orgulho. Elas entram apenas por obrigação nas peças publicitárias, muito pequenininhas, coitadas, encolhidas num canto quase junto do CNPJ do candidato e da gráfica. A estrela está super-discreta, o tucano está completamente extinto, e o sol DEMoníaco está curiosamente uruguaio. Vermelho, nem pensar. Nem nas peças do candidato petista nem do candidato comunista: nada de vermelho. Vermelho passou a ser proibido, voltou a ser a cor da anarquia, a cor da juventude (e essa campanha não é jovem), a cor de quem come criancinha e esquece um fio de sangue escorrendo no canto da boca. Não sei que diabos deu nos publicitários, mas parece que todos combinaram pelo fim do vermelho. Nem roupa vermelha os candidatos podem mais usar. A cor da moda e da publicidade agora é azul. Azul. Tudo azul com bolinhas brancas. Azul, céu de brigadeiro. Azul serenidade. Eca.
Neste final de semana eu surtei. Quem quiser que se esconda, mas eu sou é vermelha. Como não tinha mais esse tipo de farda, comprei tudo vermelho, da boina ao tênis. Roubei uma das pouquíssimas bandeiras vermelhas que encontrei pelo comitê. Fiz de minha garganta uma buzina e ela ficou rouca de tanto gritar o nome do meu candidato e também desaforos aos oponentes que passavam. Queria mesmo provocar, e provoquei. E acho que os oponentes viram que eu não tava pra brincadeira, que tava a fim de quebrar o pau da bandeirona na cabeça de um. Provoquei, provoquei, e ninguém veio tomar satisfação. Irada, invadi o QG inimigo empunhando minha bandeira: fui ao café da praça, tradicional ponto da elite DEMoníaca. Fui lá, sentei, deixei minha bandeira erguida e pedi um chopp. Os quatro velhinhos que estavam lá me olharam com medo. Juro que vi medo naqueles olhos embaçados. Encarei-os. Meu queixo os desafiou para uma gracinha qualquer, uma piadinha, uma zombaria. Nada, não veio nada. Pagaram a conta e foram embora.
Essa merda de campanha higiênica. EU QUERO DE VOLTA O MEU PT!

quarta-feira, 17 de setembro de 2008

Apagando mais uma velhinha

Juro que procurei uma foto minha, mas não tem nenhuma!
Só encontrei essa da tatoo. Com vocês, minha fadinha Sá.

Há um ano e quinze dias eu iniciei esse blog. Comecei contando o quanto me acho sortuda. Gente, eu tinha tudo para dar errado na vida, e dei mesmo. Mas podia dar errado no mau sentido, e daí me livrei. Gosto da vida que levo, do jeito que a encaro. Sou tão narcisista que amo meu principal defeito, segundo os outros: minha língua afiada - ou, como eu prefiro dizer, meu excesso de sinceridade que exponho assim, de um modo meio irônico e cínico demais para as pobres almas que a experimentam. Gosto de esportes, e o meu predileto é tirar onda da cara dos outros.
Nesses 300 e tantos dias, tratei algumas vezes de política. É mais um vício meu, quase uma cachaça. Digo quase porque, por incrível que pareça, a ressaca da cachaça é maior que a de uma decepção política. As duas ressacas são esperadas, mas, sendo pragmática (palavra da moda, né companheiros esquerdistas?), a da cachaça me dói mais. Além disso, detesto vomitar, detesto dor de cabeça, e detesto ficar estirada na cama morrendo de medo que alguém chegue acendendo a luz ou falando um tantinho mais alto. Ressaca política não dá nada disso. E ainda por cima, demora dois anos para acontecer. Já a de cachaça é muito mais frequente.
Criei o blog - acho que este é o segundo ou terceiro, nem sei mais - para escrever o que me desse na telha e, de rebote, conhecer outras pessoas que só o universo virtual possibilitaria. Consegui. Através do meu ninho conheci gente muito bacana. Algumas pessoas queridas eu poderia até ter conhecido por outras vias, já que compartilhamos de um amigo em comum, o Dimas, e de uma paixão, o Santa Cruz. A Val também fez outra linha de amizade brotar, e por coincidência, ela também é de Olinda e também apaixonada pelo Santa. Mas tem um monte de gente boa que eu só conheço virtualmente, e o blog foi a chance perfeita desses encontros. Valeu a pena, está valendo a pena.
A minha inquietude me leva a uma diversificação maravilhosa de tudo. Morei em vários lugares, conheci vários tipos de pessoas, fiz amizades com tudo quanto é gente, e me orgulho disso. O blog é também uma forma de meus amigos, que hoje estão mais afastados, terem notícia minhas, descobrirem se estou bem ou mal, se estou calma ou com o foda-se ligado. Sei disso porque quando estou demonstrando que liguei o foda-se, nenhum deles me telefona: contentam-se com um prudente e distante e-mail. São inteligentes, os meus amigos.
Então, pra resumir, queria somente acrescentar que o blog é uma válvula de escape para mim, uma maravilhosa válvula de escape. Afinal, como está descrito aqui, "este aqui é um espaço para dizer, retratar, revelar. Espero criar um hábito e, quem sabe, também amigos".
Missão cumprida - e comprida, porque continua.

segunda-feira, 15 de setembro de 2008

Culpa

Na inocência do silêncio
Mora o medo da razão
Que se cala, prudente,
E aguenta mais um açoite
Mentindo a si mesma com subterfúgios
Que desculpam o crime
Mas não o explicam
(E como poderiam?)
Retraçam as linhas do tear
Dão voltas em torno do mundo
Vão e vêm, vão e vêm
Sem que cheguem a lugar algum
Os tais subterfúgios
Que nossa razão contaminada nos oferece,
Tatuada de apelos cristãos,
Para que possamos aguentar e perdoar os açoites
Que simplesmente não têm explicação
Nem razão de ser.
Resta o silêncio...
...E o medo.

quinta-feira, 11 de setembro de 2008

Tesouro

Longe de minhas misérias
Quase nem me reconheço:
Um falar virando a cabeça para a esquerda,
Olhos sorridentes, boca lacrimejante,
Um jeito firme de encarar
Postura ereta, forte.
Longe de minhas misérias
Eu consigo ser eu mesma
Embora me desconheça, às vezes,
E sequer isso me causa estranheza.
E embora feliz,
Momentaneamente livre, completa,
Ainda sinto falta delas,
As minhas misérias.
É que, longe das minhas misérias,
As encontro no outro, nos outros,
Todos miseráveis,
Tão ou mais que eu:
Eis minha maior miséria.

quarta-feira, 10 de setembro de 2008

Amigos


Foi tão pouco, único, rápido,
Mal passou de brincadeira:
Coisa de crianças
De imaginação sobejada
E indolência maior ainda.
Coisa de impulso, leve, diáfana
Nem maior nem menor que o ato
Ou o riso que o seguiu,
Com olhos já quase fechados
E corpo deslumbrado com a maciez do arrimo.
Algo inconsequente,
Tranquilo, satisfatório.
E só.
É só disso que estamos falando:
Simplicidade, gosto, prazer.

Se eu soubesse que a amizade estava em jogo,
Não teria deitado na cama.

terça-feira, 9 de setembro de 2008

O microfone de lapela

- E essa orelha tão grande, lobo mau?
- É pra te ouvir melhor... (nem precisa da lapela!)

O rapaz que faz a tradução de textos para libras está no estúdio prestes a fazer a gravação. Da mesma forma que um locutor profissional exercita a musculatura da face fazendo caretas horríveis, o tradutor de libras fica estalando irritantemente os dedos, largando as mãos como se as pudessem soltar dos punhos e batendo asas que nem galinha.
Tudo pronto, luz, câmera e... pára, pára tudo. Chega um bisbilhoteiro, que por essas catástrofes da vida que ninguém explica é nosso patrão, e escuta algo que era para ser piada, e até sem graça, de um colega: "não esquece da lapela!" (microfone pequeno que fica preso à camisa do entrevistado). Obviamente, nenhum profissional deu bola. Mas o patrão...

- Ana, cadê a lapela? Não é possível, o rapaz tá sem lapela! Vai gravar sem lapela? Providencia a lapela, rápido.
- Sério que você quer colocar lapela no tradutor de libras?
- Claro! E ele vai gravar sem lapela? Ninguém vai escutar nada, vai ficar sem som!
- Mas ele é tradutor de libras, tá ligado?
- Sim, mas e a lapela? Rápido!
- Preste atenção: se você quiser, boto a lapela. Só não vai adiantar nada.
- É? E por quê, pode me explicar?
- Por que ele tá fazendo tradução de libras.
- E daí? Se não tiver som, ele vai traduzir o quê pra quem?
- Ele vai traduzir a fala para a linguagem dos surdos, aliás, ele só está aqui no estúdio numa hora dessas porque ele tem que traduzir tudo o que o programa fala para os surdos entenderem. Entendeu?
- Mas e a lape... aaaaaaaaaaahhhhhhhhh....

Finalmente caiu a ficha. A gargalhada começou com a minha segunda resposta, e demorou mais uns dois minutos.
A gente trabalha pra caramba, mas se diverte na mesma proporção. Taí a explicação do vício em campanhas.
Ah, até hoje o tal patrão é apelidado de lapela. Bem-feito.

Decrepititie

Mascarar a ilusão

É próprio da doçura

Da simplicidade da crença

E da podridão dos dejetos

Cada vez mais inumanos

Por vontade própria

(Porém com culpas, e quantas!)

Sem necessidade outra senão

A de iludir-se

Somente para viver.

Ah, máscara...

Onde estás?

Minha face te aguarda

Angustiada.

sábado, 6 de setembro de 2008

Descoberta


Queria saber te decifrar

Do gesto ao silêncio

Quando há náusea e

Quando há gozo

No escuro de meu quarto.

Saber de tuas vontades

Tuas virtudes, tuas tolices

Teus significados

Teus símbolos

Teu gosto

Teus sentidos

O tanto de mim que há em ti,

O pouco de ti que abandonastes em mim

Inexorável, lânguido.

Por um minuto apenas

Conhecer-te profundamente.

Por um minuto apenas

Eu te amaria eternamente

Intensamente, sem segredo

- E o fim do mistério

Me traria de volta à razão

E eu te abandonaria.

terça-feira, 2 de setembro de 2008

Natural


A vida não tem sentido,
Nem norte, nem direção,
Nem linhas predestinadas
Nem aforismos secretos.
Os significados estão em nós
- E é apenas isso,
Creia.
E viva
(leve).


segunda-feira, 1 de setembro de 2008

Antes que me esqueça...


Não aguento mais ser chamada de intransigente. Não sou! Impaciente sim, talvez. Intransigente não.
Eu vejo uma coisa errada e, se isso me incomodar (viu? Não quero consertar o mundo, só o que está ao meu redor), comento com delicadeza e/ou humor que a coisa poderia ser assim ou assado. Se continua errado, sou irônica no comentário. Da terceira vez, despacho. Resolvo. Se eu puder sair, eu saio; se puder quebrar, eu quebro; se puder terminar, termino. E priu.
Intransigência? Não. Eu só não admito algo que me incomode. Se um amigo meu quiser usar cueca vermelha de bolinha branca, eu vou achar que não tenho nada com isso, já que gosto é de cada um, o problema (se é que existe problema!) é dele. Mas se ele acha engraçadinho conversar comigo me beliscando o braço, ah, não. Aí não. Eu não gosto de beliscão, e daí? Se eu não admitir ser beliscada significa que sou intransigente?
No trabalho também é assim. Detesto ficar reclamando das mesmas coisas. Se algo está errado, quero consertar o mais rápido possível. Se o erro prejudica o meu trabalho, vou brigar com deus e o mundo para que seja consertado. E se eu tiver que brigar umas cinco vezes pela mesma coisa, aí chuto o balde e vou embora. Instransigente é a mãe. Só não sou submissa, resignada.
Nas relações, a mesma coisa. O namorado gagueja, e daí? O cabelo tá mal cortado, e daí? Bebe, e daí? Dá vexame toda vez que bebe... aí eu entro. Aí sou eu quem tá de lado. Hum hum, isso não. Nem a pau, juvenal. Nem fudendo, literalmente. Fez a primeira, toma esporro (obviamente, quando se curar da bebedeira). Fez a segunda, dane-se. Se eu estiver muito apaixonadinha, o cabra ainda pode fazer uma terceira, mas aí eu não me responsabilizo pela integridade física do sujeito. E a quarta vez ele não faz. Ao meu lado, não.
Eu tenho duas medidas de avaliação: a conta de três e o tempo determinado. Se alguém me sacaneia três vezes, é que eu sou mesmo uma otária. Se eu não corrijo algo que me incomoda em tantos dias ou meses, eu jogo fora, descarto, findo.
Tudo isso para explicar (aos poucos que estão sabendo das novidades) o que é essa minha facilidade de mandar patrão à merda. Juro: não é intransigência. É inconformismo. Mas, de qualquer forma, se quiser continuar me julgando intransigente, problema seu.
E antes que eu me esqueça... vá!