quarta-feira, 15 de outubro de 2008

Onde fica o glamour? E o banheiro?


Falo tão mal de empresas jornalísticas e seus profissionais que às vezes até esqueço que sou uma.

Já atuei em todos os meios de comunicação e em quase todos os setores, até que enchi definitivamente o saco de ter que sempre estar atenta a tudo que acontece, cumprir pautas quase sempre desinteressantes, dar plantões nos finais de semana e feriados, ter que fazer 3, 4, 5, 6 matérias por dia tendo que checar tudo, ouvir 214 lados (curiosamente, o lado "atacado" quase nunca está acessível na primeira tentativa) e ainda dar uma cara de imparcialidade ao material que será lido por gregos e troianos. Ah, tem que satisfazê-los também, tanto os gregos quanto os troianos.

Erro? Nem pensar, pois se ele acontece nossa vida vira um inferno - além da gente ter que aguentar as brincadeiras dos colegas e levar esporro dos 800 chefes existentes em cada redação, a gente ainda tem que aguentar um monte de leitores telefonando dias a fio para conversar com o repórter que cometeu o erro. Alguns leitores reclamam em tom professoral, o que é muito chato. Outros reclamam no tom de "tia" primária, que é mais chato ainda. Há os que dão esporro dizendo que o erro é imperdoável e que vão deixar de assinar o jornal por causa dele. E tem ainda os que nos afloram o instinto assassino: são os advogados, os que confundem metralhadora com ameaça de processo.

Lembrei disso porque ontem escutei a conversa de duas senhoras no banco da praça (sim, estou com folga suficiente para ir tomar sorvete no banco da praça no meio da tarde e escutar a conversa dos outros - o que significa que não estou mais trabalhando na mídia). As duas estavam espinafrando uma repórter da cidade que cometeu um assassinato à gramática. Pena que eu não consegui saber que erro tão grotesco foi esse. As mulheres só falavam o nome do jornal, a edição e o nome da repórter, mas não o erro, apesar de estarem falando do erro. Não comprei o jornal porque fiz promessa: enquanto não ganhar na megasena, não gasto um centavo para comprar um jornal, seguindo o conselho de Raulzito.

As mulheres vieram com o discurso fácil de que repórter tem que saber o português perfeito e não pode se dar ao luxo do erro. Concordo, mas... quem nunca cometeu um erro de português que atire a primeira pedra. Eu não posso, já cometi e continuo a cometer. Mas o mais grosseiro de toda a minha vida aconteceu quando eu trabalhava no Jornal do Commercio, em 92/93. Não sei por que cargas d´água eu usei a palavra "ossada" em vez de "alçada". Meu rosto fica vermelho até hoje quando lembro disso. Sei, e naquele tempo eu já sabia, a diferença de significado entre as duas, mas errei, e priu. Lembro que meu editor pediu explicação para o erro, e eu caí na gargalhada dizendo que a única explicação é que eu era burra mesmo. Merda feita, esporros e gozações tomadas, estou livre do pecado (quando é útil, lembro que fui batizada e crismada).

Quando dá saudade daqueles tempos (sim, tenho minha porção masô), lembro dos carnavais e aí a saudade passa ligeirinho. Vocês conseguem imaginar o que é ter que ficar de plantão e - pior que o plantão - ter que fazer matérias de carnaval? Entrevistar folião (o que é que um folião pode dizer de interessante, meus deuses?), falar que o bloco tal saiu com atraso mas arrastou multidão, que a polícia quebrou o pau num adolescente porque estava com lança-perfume nas mãos... Ah, que carnavais jogados fora!

Quando a gente é repórter fica insensível em muitos momentos. Como na noite em que Chico Science morreu. Adorava Chico Science. Era uma noite de domingo de carnaval, eu fiquei de plantão o sábado e o domingo todinho e, finalmente, aquele inferno tinha chegado ao fim. Peguei meu carro e fui para a casa de minha mãe, em Olinda, onde passaria o resto do carnaval. Vi o acidente quando passava o viaduto da Marinha, mas nem dei bola. A Polícia tava chegando quando eu passei, e tinha um monte de curiosos. Chego em casa, estaciono o carro, entro e escuto aquela musiquinha de terror da Globo quando tem uma notícia extraordinária. Escutei a notícia da morte de Chico Science ao mesmo tempo em que meu celular tocou. Era o editor. Eu tinha que voltar para a TV por causa do acidente. Como disse, eu adorava Chico Science.

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