sexta-feira, 14 de dezembro de 2007

Vertigem


Quinta, dia 13, 7 horas da manhã. Depois de passear por todo o térreo, subo ao primeiro andar do prédio do Mercado Municipal de São Paulo. Lindo, tudo muito bonito, movimento ainda fraco. Resolvo me aproximar do parapeito para tirar uma foto de uma loja de frutas. Tiro a foto e olho para baixo, tentando encontrar algum dos parceiros de viagem.
Encontrei foi uma tontura, a sensação de que o sangue se recolhe, todo o corpo meio dopado. Não sei mais onde estou. Lembro que estou em São Paulo. Lembro de ter chegado de ônibus pouco tempo antes. Lembro que a pessoa junto de mim é amiga, que posso confiar e contar o que está acontecendo, e pedir ajuda. Sei o nome da pessoa. Sei tudo e não sei nada, ao mesmo tempo. Separadamente, conceitualmente, sei que estou num mercado, e que é São Paulo, e que viajei a madrugada inteira. No entanto, na hora da conexão destes dados em minha mente, algo falha. E, no conjunto da obra, sobra uma angústia absurda por não saber, e por lembrar que isso já me ocorreu outras vezes, e que perdi temporariamente a memória. Em São Paulo.
Me agarro ao braço do amigo, conto que estou zonza e que ele me tire dali imediatamente, me leve a um lugar afastado do parapeito, onde eu possa sentar. Acomodada, bebo água. Minutos depois me sinto bem melhor. Mas desço as escadas sem olhar para o chão e fico no térreo o resto do passeio.
Saio do mercado. Olho para um lado e outro, e não sei para onde devo me dirigir. Sei que estou perto da 25 de março (semana antes do natal!), perto da Sé, perto da Estação da Luz, enfim. Vejo a Sé ao longe. Só que não sei como chegar em nenhum desses lugares, tantas vezes visitados por mim antes. "Desmemoriada" em São Paulo! Preciso chegar na casa de uma amiga. Sei o endereço dela, até o número do apartamento. Mas não consigo lembrar do bairro, nem como chegar lá.
Me interno no ônibus da Prefeitura no qual viajei. Somente perto do meio-dia tomo coragem e, acompanhada do meu amigo, e pedindo indicações de esquina e esquina (como se eu nunca tivesse passado por estas ruas!) chego à Estação da Luz. Ligo para minha amiga, anoto direitinho como chegar na Vila Madalena. Dentro do metrô, porém, resolvo passar pela Paulista e comprar livros. Subindo a escadaria da Estação Trianon, nova vertigem. Agora, sozinha, na Paulista, carregando mala. Me enfio na Livraria Cultura, compro o que quero, ligo novamente para a amiga, e desta vez anoto tudo direitinho, como fazer para chegar ao meu destino. Morta, exausta, um pouco assustada, chego lá. Durmo, durmo, durmo. Só levanto às 20h30 com a campanhia tocando e a barriga roncando. Durante o dia, tinha comido apenas uma salada de frutas no mercado. Saímos, comemos, parei numa lan para checar se um pedido em particular tinha sido atendido: uma alegria neste dia infernal.
Volto para casa morta de cansada e durmo como criança, exausta.
Depois desta quinta, São Paulo nunca mais será a mesma para mim.

3 comentários:

Anônimo disse...

Cláudia,

Fiquei tonto com a vertigem da personagem que muito bem poderia ser você. Se não é, de fato.

As histórias de natal já não são contos de fadas. Para comprovar isso, além do seu texto, basta ler o de Josias.

Um abraço,

Dimas Lins

A Autora disse...

Dimas,
o pior é que não é conto. Aconteceu mesmo. Mas agora tudo bem: estou a caminho da praia!
Beijos!

Canto da Boca disse...

Putz! Nem mesmo Cortázar, em suas narrativas "fantásticas" criou algo assim, parece a continuação do Bestiário.
Nem Sao Paulo e nem Ana, nunca mais serao as mesmas.