quinta-feira, 1 de novembro de 2007

Inconsciência


Estou no comecinho do livro "1984", de George Orwell. Um dos assuntos que trata é a manipulação da história: como um sistema absolutista cria, muda e impõe a história ao mundo, transformando homens em heróis, vilões ou nada, de acordo com a sua conveniência. Fatos ganham elogios e notoriedade, enquanto outros são simplesmente "vaporizados", para usar o termo do autor.
Ainda nesta semana li uma matéria da Carta Capital sobre a morte de Che Guevara. A história modificada ao sabor dos interesses até hoje incomoda. Sabe-se de muitas versões, mas quem saberá o que houve de verdade? A reportagem levanta a hipótese do assassinato ter sido determinado pela CIA. Por outro lado, documentos da época "revelam" que a panaquice foi um desvario do comando militar boliviano sem prévia consulta e com a desagradável e prevista consequência do nascimento de um mártir à morte de um homem. Fato concreto: Che morreu.
Já falei aqui, em outro texto, que na infância eu desconfiava de que tudo no mundo existia apenas para me enganar (claro que confesso meu egocentrismo, embora naquela época eu o praticasse com ingenuidade). Achava que a história não existia. Que meus bisavós eram lendas, e tudo o mais que remetesse ao passado. Só me conformei de que estava errada quando novos integrantes da família foram nascendo. A lógica era: os novatos também podiam pensar que eu era parte da mentira. Por uma questão de sobrevivência histórica, resolvi parar de pensar nisso tudo.
Quando eu estava quase curada (é que ainda estou saindo da infância, tenham calma), pego nesse livro, leio essa reportagem e fico ensimesmada. Já sei que meus bisavós não foram lendas, que existiram de fato. Mas não sei o quanto de verdade há no que me contaram sobre eles. Não sei o quanto de verdade eu repasso para meus sobrinhos. Fico imaginando quantas personagens foram criadas ao longo desses milênios de existência humana. E quantas teriam sido injustiçadas pela história?
Quando criança eu não acreditava em história. Era uma lógica torta, infantil. Mas não deixava de ter um fundo de razão.
Hi, Big Brother.

3 comentários:

Anônimo disse...

cláudia,

1984 aborda a questão do totalitarismo sob uma ótica interessante. Uma grande mentira organizada e orquestrada para manter o controle sobre o cidadão. O filme, que assisti a muito tempo atrás, me deixou encafifado com câmeras ou vigilâncias governamentais. Depois disso, tenho um medo da peste de ser filmado em público. Esse negócio de grande irmão, já bastam os que eu tenho que são muitos.

Quanto a Che, não sei o que seria dele, se ainda hoje estivesse vivo. Talvez também fosse ditador, como Castro, ou, quem sabe, teria invadido Cuba de bengala para puxar as orelhas do comandante. Há muita coisa boa em Cuba, mas ditadura é ditadura, seja ela de direita ou de esquerda.

A propósito, a lagosta custava 25 reais, mas vieram oito. Porto estava uma delícia, pouca gente e um mar lindo. Amanhã deverá estar um caos. Fico em casa que é melhor.

Ah, o feriado para mim começou hoje, não ontem. É que depois do fim do expediente já estava celebrando a paz mundial.

Beijos e bom feriadão!

Dimas

Anônimo disse...

Se há um cabra para inspirar uma renovação moral da esquerda, esse cabra é Orewell. Fundamental para a construção de uma esquerda pós-totalitária. É o maior crítico do século XX da hipocrisia. Vários de seus livros estão sendo traduzidos no Brasil. "1984" foi um dos livros que mais me influenciaram e que me deram mais calafrios.

Josias de Paula Jr. disse...

Sobre 1984, concordo com Dimas e Artur. Mas, devo confessar: foi um dos poucos exemplos em que gostei mais fo filme que do livro.

Quanto ao insondável da história, é a consequencia de vivermos dentro e pela linguagem, né?!

ps; Outro autor que foi muito feliz na crítica ao totalitarismo foi Boris Pasternak.