segunda-feira, 3 de setembro de 2007

É dia de feira


- O morango tá a um real aqui, moça!
- Quer levar abacate? Faço três por um real pra senhora.
- Olha que beleza de laranja, freguesa! Vai querer quantas?

Domingo. Feira livre. Famílias inteiras reunidas obstruindo ainda mais o parco espaço entre duas calçadas, já interrompido por barracas no meio. Homens, mulheres. Velhos, sobretudo. Crianças. Cheiro de fritura no ar. Barulho, muito barulho. Um rádio toca alto, as pessoas conversam alto, os feirantes gritam. E eu ali, no meio daquele caos agendado. Manhã de domingo.
Depois de fazer algumas compras, só ando. Caminho entre as barracas de frutas e verduras, depois passo no setor de roupas, findo a linha reta no ramo da pirataria, onde adiciono mais itens na sacola que me custara dois reais há dois minutos. Volto. Roupas, frutas e verduras, frituras, biscoitos, grãos, frutas e verduras, pracinha, banco. Sento. Olho. O ônibus passa, o motoqueiro mascarado passa, o carro pára e a mulher desce e o carro sai à procura de estacionamento, o cara distribui jornais gratuitos (a favor do governo local), o menino vende jornal por cinquenta centavos (contra o poder local). Pego um e compro o outro. Não leio, exceto manchete. Nada novo.
Retomo a atenção ao caos programado em que me encontro. Há gente aferindo pressão numa barraquinha. Tem pessoas que saem de lá com um diagnóstico de pressão alta e decididas a comprar mais legumes e verduras e frutas, e o fazem, para depois parar numa barraquinha e pedir um pastel com caldo de cana. A variante é a coxinha. Chego a flagrar um hipertenso seguindo este roteiro, e não tenho dúvidas de que seja a rotina de outros.
Olho em volta. Nada da figura.
Encontro um conhecido. O cumprimento, trocamos algumas palavras gentis, ele segue e eu fico. Sentada no banco, observando, olhando, esperando, indo.
O som está agradável, até. Não gosto de música sertaneja, mas reconheço que esta vem bem a calhar. Afinal, não estou em cenário de bossa nova nem tampouco de rock. E música sertaneja nesse contexto até que é bem agradável. Só estranho é que o cheiro das verduras não domine o espaço. Meu olfato registra fortemente a presença de frituras e da poluição gerada por carros mal cuidados, principalmente ônibus e caminhões que circulam nos arredores. Queria sentir o cheiro do coentro, mas aqui não tem disso não. Coentro sim, existe; mas o cheiro não. Deve ser produto típico nordestino. Deu saudade.
Chega, né? Mais de duas horas nessa observação e nesse devaneio preguiçoso e me dou conta que poderia fazer o mesmo em minha casa. Não teria o cenário da feira, só que a memória não é tão fraca assim, dá para o gasto. Vou pra casa. Ah, lembro que não comprei côco seco. Quero fazer doce de côco. Passo no mercado, depois pego o ônibus e volto. Passo novamente na feira. Essa agitação me é agradável, o barulho me soa como uma lembrança boa de tempos pré-adolescentes, sinto vontade de escrever sobre tudo isso. Olho mais uma vez pela janela do ônibus.
Volto pra casa, sacola cheia, de bem comigo. Gosto de feira. Tomo uma dose de cachaça em casa. Amanhã - hoje - faz 15 anos que minha irmã morreu. Mas eu realmente gostei muito de ir à feira. Pena que não vi o sorriso. Gostei do som. Vou escutar um dos três CDs piratas que comprei na barraquinha. Droga: amanhã - hoje - é segunda.

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